Movimentos indígenas reivindicam justiça climática e representatividade nos espaços decisórios
14 de novembro de 2025Protestos também evidenciam contradições da COP30 e da gestão do Governo Lula
“Justiça climática para nós é nós sermos ouvidos. Justiça climática para nós é demarcar nossas terras. Justiça climática para nós é ser respeitado. Justiça climática para nós é a gente participar de decisões como essa da COP, que está tendo agora. Justiça climática para nós é respeitar a nossa forma de vida, a nossa tradição, a nossa cultura e nosso encantados. Justiça climática para nós é nos ouvir e que seja respeitado o direito de quem faz a vigilância do bem maior na terra, que é o oxigênio, para que a gente continue dando seguimento à vida. E isso para nós é justiça climática. Se não tiver isso, não é justiça para nós.” Para o Cacique Gilson Tupinambá, da aldeia Papagaio, Cacique Geral das 28 aldeias da terra indígena Tupinambá e coordenador do conselho indígena Tupinambá do Tapajós da Amazônia, essas são as principais reivindicações das populações indígenas na COP30.
A Marcha Global pela Saúde e Clima, organizada pelo Movimento Médicos pelo Clima, e idealizada pelo Instituto Ar e pelo Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), aconteceu na terça-feira, 11 de novembro, no segundo dia da COP30. Com a participação de instituições nacionais e internacionais — entre elas, a Fiocruz, o Movimento Saúde Sustentável, o Médicos Sem Fronteiras (MSF). Alguns participantes da marcha seguiram em forma de protesto para a entrada principal da Zona Azul, local onde acontece a programação oficial do evento.
Na tarde da quarta-feira (12), lideranças indígenas do Baixo Tapajós realizaram uma coletiva de imprensa para explicar os recentes acontecimentos e reafirmar a legitimidade de sua mobilização. Durante o encontro, as lideranças exigiram respeito e criticaram a falta de diálogo com o governo federal, que, segundo elas, não tem garantido ações efetivas em defesa dos povos indígenas. Ressaltaram ainda que o objetivo do ato não foi causar danos ou quebrar espaços, mas chamar a atenção do governo federal e da ONU para a ausência de representatividade indígena nos espaços de decisão da COP.
Mesmo na condição de ouvintes, a participação nos espaços oficiais estava condicionada a uma autorização via credencial emitida pela organização do evento. Entretanto, indígenas denunciam que apenas 14% de sua delegação teve acesso à área. Samara Pará Mirim, da Terra Indígena Jaraguá, em São Paulo, considera que essas barreiras “dificultam intencionalmente” a presença dos povos indígenas, da população em geral e de todo povo tradicional e de luta, impedindo que sejam escutados.
Samara enfatiza que os povos indígenas são os verdadeiros protetores da Amazônia e da biodiversidade, e que não estão sendo ouvidos nos espaços de tomada de decisão da conferência, ainda que a COP30 esteja ocorrendo em seu território. “O que aconteceu ontem não foi uma invasão. Nós não invadimos nenhum lugar, nós ocupamos um lugar que é nosso por direito, que é esse espaço de tomada de decisão sobre o nosso futuro. Porque não tem como decidir sobre o futuro pensando em uma forma capitalista”, defendeu.
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), os povos indígenas protegem mais de 80% da biodiversidade do mundo. Por isso, falar sobre justiça climática passa, necessariamente, pela demarcação das terras indígenas – um dos principais temas reivindicados pelas delegações indígenas.
Em entrevista ao portal G1, o presidente da COP 30, embaixador André Corrêa Lago, classificou o episódio como “um incidente” e afirmou que ele não deve ser interpretado como algo de maior relevância nem como um fator que diminua a importância da participação da sociedade civil no evento.
O ato da terça-feira não foi um movimento isolado liderado por indígenas. A Zona Azul amanheceu na sexta-feira (14) com a entrada barrada pelo Movimento Ipererg Ayu do povo Munduruku. A principal demanda do grupo era uma reunião imediata com o Presidente Lula, e ocupou a entrada na zona das decisões desde às 5h da manhã.
O grupo pedia pela revogação do Decreto 12.600/2025, responsável pelo Plano Nacional de Hidrovias, pelo cancelamento da Ferrogrão, pela proteção contra grandes empreendimentos e pela aceleração das demarcações de terras indígenas.
Por volta das 8h, o embaixador André Corrêa Lago e a CEO da COP 30, Ana Toni, se encontraram com o grupo para negociar as demandas. As lideranças Maria Leusa Kaba Munduruku e Alessandra Korap seguiram para uma área reservada para debater com os representantes da conferência e as ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sônia Guajajara (Povos Originários).
A reunião culminou no fim do bloqueio e com a promessa da aceleração da demarcação das Terras Indígenas Sawré Muybu e Sawré Ba’pim. O Governo Federal também se comprometeu em fiscalizar os impactos dos projetos de infraestrutura na bacia do Tapajós, também denunciados pelo protesto.
Ana Letícia Ferro é Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela UFMA. Pesquisadora do Grupo Estrema, com enfoque na temática de Gênero e Jornalismo Esportivo. É membro do Laboratório Experimental de Jornalismo da UFMA – Laborejo.
Arthur Serejo é estudante de Jornalismo na UFMA, membro do Laborejo e do GECULT. Tem experiência em assessoria de comunicação, produção de conteúdo e cobertura de eventos. Atua em órgãos públicos com foco em redação, mídias sociais e análise de mídia.
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